Ultimamente há um grande movimento norteando a Justiça brasileira, chamado “Direito Sistêmico”?
Idealizado por Sami Storch a expressão Direito Sistêmico surgiu da análise do direito sob uma ótica baseada em algumas Leis Superiores. Essas Leis regem as relações humanas, segundo a ciência das constelações familiares sistêmicas que foi desenvolvida pelo filósofo alemão Bert Hellinger.[1]
A constelação familiar é um método capaz de possibilitar o diagnóstico de um conflito, isso porque, sua análise parte das compreensão do indivíduo como um membro de um sistema, seja ele pessoal, familiar, organizacional ou qualquer outro subsistema que ele esteja inserido (amigos, igreja, político, econômico..)
Com isso a análise é a partir da observação de um indivíduo além da sua pessoa, observando os padrões de vida de seus irmãos, pai, mãe e avó, e assim, compreendendo o que vem sendo repetido na família.
Então, o objetivo de uma constelação familiar é compreender a raiz de um conflito.
E o que é inovador nesta técnica é que muitos conflitos que regem as nossas vidas e fazem com o que repetimos padrões, adoecer ou mesmo litigar, são dinâmicas desconhecidas pela razão, pois elas estão instaladas no inconsciente.
Através do método da constelação, o facilitador tem as técnicas necessárias para ler as informações trazidas pelo campo do cliente e com isso há a possibilidade de estabelecer a paz.
Dessa forma, o cliente toma consciência do que está ocorrendo e tem a possibilidade de pensar e agir diferente.
O direito sistêmico se propõe a encontrar a verdadeira solução em litígios e também extrajudicialmente. E, essa solução precisa equilibrar as duas partes, ou seja, nunca poderá ser apenas para uma das partes. Ela sempre precisa abranger todo o sistema envolvido no conflito. Pois, na esfera judicial, principalmente, basta um pessoa querer, que duas ou mais tenham que brigar. Se uma pessoa daquele sistema não está bem, todos envolvidos naquele sistema é afetado.
Sami Storch conseguiu 100% de acordo em uma vivência de constelação, onde as duas partes optaram por participarem com tema comum como: guarda, alimentos, infâcia e juventude, menores infratores; violência doméstica, alcoolismo, drogas e afins e a partir da publicidade dessa percentagem, o método de constelação no Judiciário foi difundido.
Hoje essa técnica está sendo utilizada em 13 Tribunais, dentre eles, o Paraná, inclusive na cidade de Maringá, e vem alcançando metas surpreendes de acordos. Essa técnica tornou-se possível através da resoluçãoo 125/2010 do CNJ que prevê “outros métodos consensuais de solução de conflitos” podendo ser aplicado antes, durante e depois de qualquer meio alternativo de resolução de conflitos, como a mediação, conciliação e negociação.
Com a utilização da aplicação das leis sistêmicas sobre as leis brasileiras abre-se grandes possibilidades tanto dos envolvidos no judiciário, bem como um leque de trabalhos para advogados que, tem o desejo de realizar seus processos de forma autocompositiva, podendo assim, obter soluções em seus escritórios.
Observando nosso acumulo de demandas, o direito sistêmico contribui para solução extrajudiciais ou até o de desenvolvimento das demandas já judicializadas, isso porque, ao atingir o real conflito que deu origem ao litigio, não será mais necessário continuar com ele, pois você compreende a dor do outro e as razões que o levaram à determinados comportamentos.
Sabemos que as tentativas de resoluções de conflitos de forma equilibrada e que traga sensação de Justiça não é batalha fácil e são práticas usadas ao longo de séculos e séculos. Um bom exemplo para ilustrar essa dificuldade seria o caso do Rei Salomão, no qual duas mulheres brigavam entre si pela maternidade de uma criança. Após muitas discussões infrutíferas o Rei entendeu por bem cortar a criança ao meio e dar metade à cada mãe que entendia ser sua progenitora. No entanto, a verdadeira mãe abdicou do seu filho em prol da outra, para que seu filho permanecesse vivo. O Rei então compreendeu que a mãe que suportava a perda do filho, era a verdadeira mãe e decidiu entregar o filho a sua legítima mãe.
Decisões como esta se baseiam em sabedoria. Mas vivemos em um Estado Democrático de Direito que se baseiam em uma Constituição Federal e Leis que precisam ser observadas.
Ocorre que, algumas vezes, a lei fica estabelecida e o processo se finda, mas os problemas não, estes perduram, e essa continuidade desse conflito pode dar causa a outras demandas judiciais.
Isso ocorre por uma razão muito simples. Somos seres afetivos dotados de uma substância única, muito falada mas pouco compreendida. Dentro de nós só há uma única substância e isso é tudo que há. Essa substância pouco compreendida é chamada de Amor. Sim, somos seres cobertos de amor e podemos cometer as maiores atrocidades por amor. Isso porque para o amor fluir ele precisa de uma ordem. Há uma ordem para o amor e o amor em desordem é capaz sim de matar, de alienar, de excluir. Mas quando fazemos isso, muitas vezes estamos na perseguição do pertencimento. Todos pertencem à um sistema familiar e por ele faremos de tudo para sermos aceitos e se não formos aceitos, então excluímos, e também fazemos isso por amor, mas um amor em desordem. Um exemplo de desordem são os súditos do Estado islâmico que para pertencer, são capazes de matar sem piedade, ou Hitler e seus comandantes de campos de concentração que acreditavam estar “limpando” a raça ariana.
Para entender essa premissa é necessário uma compreensão que somos afetados por leis universais querendo ou não, sendo justo ou não, elas atuam o tempo todo. São das chamadas Leis do Amor por Bert Hellinger ou ainda de três leis sistêmicas.
A primeira chamada Lei do Pertencimento. Através dela, todos nós pertencemos, todos nós temos o nosso devido lugar na nossa família. Todos da família precisam ser vistos e reconhecidos nos seus devidos lugares, mas quando não reconhecemos o lugar de alguém ou excluímos alguém, esse lugar será visto por outro. Exemplo claro e corriqueiro são os abortos. Os filhos não nascidos que não são vistos, podem emaranhar os filhos seguintes, muitas vezes desenvolvendo até problemas como depressões, ansiedades, esquizofrenia, identidade de gênero, dentre outro. Outro caso muito corriqueiro no Direito são as alienações parentais. A mãe por querer o melhor ao filho pode cometer um mal ao filho que destinará seu futuro, excluindo um Pai. Quando o filho sente a exclusão do Pai, o filho, por amor, poderá repetir os padrões do Pai, apenas para que aquela pessoa seja vista assim como é. Se o Pai é alcoólatra, o filho quando cresce passa a beber, para honrar aquele lugar do pai excluído. E isso é apenas uma possibilidade dentre inúmeras.
A segunda Lei é a Lei da Ordem, o que significa dizer em breve relatos que o amor possui sim uma ordem e quando não olhamos essa ordem também causa conflitos ou emaranhamentos. Um exemplo dessa desordem é quando uma filha em seu íntimo, acredita que sua mãe não é boa o suficiente para seu Pai e fica “casada” com o Pai. Esse Pai para a filha ocupa um lugar, mas não o lugar de Pai e sim o lugar de um “cônjuge”, logo ao lado dela não tem espaço para seu companheiro, pois duas pessoas (almas) não podem ocupar o mesmo lugar. Essa filha pode não vir a se casar ou se casar ela não estará disponível para seu marido. Este marido, ou melhor dizendo o Ser (alma) do marido sente a ausência da esposa e a trai (uma possibilidade). Aqui temos várias pessoas ocupando lugares de outras pessoas. E, um conflito de divórcio, por exemplo, pode estar ocorrendo por falta de indisponibilidade do estar-presente. É preciso compreender essas leis para entender os casos judiciais de família, divórcios, guardas, inventários, dentre outros, para então trazer luz às partes, pois as demandas judiciais podem ser apenas consequências de desordens do amor.
A terceira lei, é chamada de Lei da Troca ou Lei do Equilíbrio, através dela, somente podemos dar aquilo que recebemos. Quando uma mulher, por exemplo, se doa demasiadamente para o marido, ela espera que ele também assim o faça, mas se esse marido não recebeu afeto, por exemplo, como é que ele pode dar aquilo que ele nunca recebeu? Num caso assim, o marido muitas vezes, sai do sistema, e a mulher o considera ingrato, mas na verdade, o que ele fez, por amor, é deixar um sistema incompatível pelo desenquilíbrio em dar e receber. Em um caso de relacionamento equilibrado, ambos precisam dar um passo, e nunca um dos cônjuges três passos para o outro, sem receber nada, pois se assim for, este dará três passos para trás e os relacionamentos terminam por desordem da troca.
E com o conhecimento das leis sistêmicas como o Judiciário poderia ajudar as partes?
O Código de Processo Civil instituiu a obrigatoriedade da conciliação e mediação dos processos judiciais, no qual estabeleceu que os Juízes e as partes envolvidas se submetem a conciliação e mediação, trazendo um avanço no ordenamento Jurídico. Ou ainda, através de Círculos de Construção de Paz pela Justiça Restaurativa, dentre outras formas.
E ainda a resolução n. 125/10 do CNJ traz que poderão ser adotados, outros métodos autocompositivos para solucionar um conflito, e um bom exemplo seria as constelações familiares.
Assim, enquanto que na mediação visa o restabelecimento do diálogo entre as partes através da escuta ativa, a constelação familiar pode agregar para a solução da raiz de um conflito.
Isso porque, quando as partes estão falando, elas relatam o que de fato está ocorrendo em suas vidas, mas não sabem que muito desses episódios somente ocorrem por algo completamente estranho ao seu conhecimento pessoal.
Muitas coisas das quais fazemos, sentimos e desenvolvemos no corpo são só efeitos e sintomas de algo que está escondido no subconsciente. Sim, é isso mesmo, nossos traumas, rejeições, medos, traições, mortes, suicídios, abortos, dentre outros fardos pesados que carregados são só repetições de um padrão familiar.
Um mediador, um juiz, um advogado que conhece a técnica da constelação pode atuar não só como auxiliar da Justiça mas muito mais que isso, pode ajudar as partes a solucionar um conflito de padrões hereditário e com isso, por fim ao sintoma através da solução pela raiz do conflito.
Todavia, o direito sistêmico então é o uso do conhecimento das leis sistêmicas nos conflitos nos casos de Direito de Família, Sucessões, Infância, Juventude, Violência Doméstica, Falência, Vara de Trabalho, dentre tantas outras.
O que busca essa nova forma de resolver o conflito é disseminar o conhecimento dessas leis superiores que atuam em nós o tempo todo mas, nós, ocidentais, por muito tempo desconhecíamos a sua força. Através desse conhecimento sistêmico podemos mudar nossa visão de nós e do outro, pois ao contrário do que imaginamos, nosso livre arbitrio por exemplo, não é tão livre assim, estamos carregando alguns fardos que não são nossos mas, que existem para equilibrar os sistemas familiares e assim, continuar a perpetuação da espécie humana.
E assim, compreendendo melhor essa visão sistêmica nas famílias e na sociedade, podemos conviver melhor com o outro e passar a construir uma sociedade mais harmoniosa.
[1] STORCH, Sami. Direito Sistêmico. Disponível em < https://direitosistemico.wordpress.com/2010/11/29/o-que-e-direito-sistemico/>. Acess em 05 out 2016.
Bibliografia:
Hellinger Bert. Ordens do amor – Editora Cultrix – Edição brasileira 2002.
Hellinger Bert. A fonte não precisa perguntar pelo caminho. Editora Atman – Edição Brasileira 2005.
Hellinger Bert. O amor do Espírito. Editora Atman – Edição brasileira 2009.